Baratas - Capítulo 5 - Laboratório

 Terminator observava, oculto pela mata, a última instalação que faltava averiguar, o laboratório. Mas algo o incomodava. Diferente das últimas vezes, seu Sentido Barata não apontava nenhum perigo. De fato, durante todo o tempo em que permaneceu observando o laboratório, não havia notado qualquer barulho ou movimento.

Aquela misteriosa tranquilidade o preocupava mais do que se estivesse cercado de inimigos. Assim, por via das dúvidas, ele lançou mão de todas as suas armas: arma-chinelo, pulverizador e granadas de veneno e lança-chamas. O exterminador estava preparado e armado até os dentes.

O laboratório era um prédio pequeno, um caixote branco no meio do arvoredo. Ele se aproximou da porta furtivamente. Ainda assim, o sensor de movimento percebeu sua presença e a porta abriu-se sozinha. Ele lançou um olhar rápido para dentro e constatou que imperava uma ordem e um silêncio absolutos naquele ambiente.

O homem adentrou o local e explorou todos os corredores e salas. Não havia nenhum corpo e tudo estava no lugar. Depois de perambular por alguns minutos, o Sentido Barata emitiu um leve alerta. Terminator olhou em volta, atento ao menor movimento, mas não havia nada. Foi então que seus ouvidos captaram um som muitíssimo baixo de vidro tilintando, um som que apenas ele, com sua super audição, poderia ouvir.

O exterminador seguiu o som até uma sala. Por baixo da porta um feixe indicava que a luz estava acessa. O Sentido Barata ficou mais intenso. Com o dedo pronto para pressionar o gatilho do lança-chamas, ele abriu a porta. A sala possuía longas bancadas de mármore, sobre as quais repousavam vidrarias de laboratório, preenchidas por líquidos coloridos.

Havia também computadores de última geração, todos ligados. As telas exibiam complexos modelos 3D de moléculas de DNA. Um caderno estava aberto sobre uma bancada. Nele haviam anotações em linguagem técnica, que Terminator nem se deu ao trabalho de tentar compreender. Contudo, ele intuiu que aquelas anotações tinham a ver com técnicas de splicing e transgenia animal.

Então, ele andou até o fundo da sala. Lá havia um homem sentado de costas, vestia um jaleco branco, o cabelo preto estava ensebado e despenteado, a postura muito curvada para a frente. Parecia estar absolutamente imerso na manipulação de algumas substâncias, totalmente alheio ao que se passava ao seu redor.

-Dr. Michael Roach? – indagou Terminator, em tom desconfiado, porém, não houve resposta.

-Dr. Roach, o Presidente me enviou para resgatá-lo. – Insistiu mais uma vez.

-Elas não são incríveis? – começou o cientista, com uma voz estrangulada. – Ágeis, inteligentes, eficientes em sua reprodução e adaptadas a todo tipo de intempéries. Não é à toa que estão em todos os biomas. Também não é surpresa que estejam sendo selecionadas pela mãe natureza a 380 milhões de anos! HAHAHAHAHA

Terminator abriu a boca para falar, mas antes que pudesse emitir qualquer palavra, o cientista recomeçou aquilo que mais parecia um monólogo consigo mesmo do que uma conversa.

-O homem e a barata são as duas espécies que realmente dominaram o mundo! Agora imagine o que poderíamos fazer se juntássemos os dois! As possibilidades seriam simplesmente infinitas. Eu sempre disse isso a eles, mas eles nunca me ouviram. Aqueles tacanhos de Harvard e do MIT nunca compreenderam a grandiosidade das minhas ideias. Nunca me deixaram desenvolver minha pesquisa, com aquele papinho ultrapassado de ética profissional.

-Hum a velha frustração do gênio incompreendido. Isso nunca acaba bem... – Pensou Terminator, já prevendo onde aquela conversa iria terminar e assumindo uma postura defensiva.

-Mas agora eles vão ver. – a voz do cientista tornou-se ainda mais alterada. - Todos vão ter que reconhecer que eu tinha razão. Homem e barata, juntos, se tornarão ... A RAÇA PERFEITA!!!

Nesse momento, o cientista virou-se e encarou Terminator, revelando o seu rosto medonho de homem-barata. Os olhos redondos e escuros, as longas antenas e a boca horrenda. Além disso, sua anatomia peculiar indicava que ele havia reunido as características de diferentes espécies de barata.

Frente àquela aberração, Terminator não teve dúvida, apontou o pulverizador de veneno e disparou. O jato foi preciso, mas o alvo saltou e grudou na parede. Novos disparos se seguiram, mas o monstro desviava saltando pelas paredes e desaparecendo sob as bancadas.

Então, Terminator vestiu sua máscara de gás e estourou algumas granadas de veneno na sala. O gás esverdeado logo encheu o espaço. O monstro ficou furioso e, com um golpe, abriu um buraco no teto, por onde tentou fugir. Mas Terminator o seguiu pela passagem. Ambos se esgueiraram pela abertura até alcançarem o teto do laboratório. Agora do lado de fora, os oponentes se encararam por um momento.

O monstro levantou voo. Terminator disparou o veneno várias vezes, porém, novamente, apesar de sua mira apurada, foi superado pela agilidade do monstro, que esquivou dançando no ar e depois estocou com raiva. O homem levou um chute de grande potência que o mandou para longe.

Depois, sentiu o chão sumir sob seu corpo. Quando deu por si, já estava suspenso muito acima do chão, de onde foi lançado contra o solo. O impacto foi doloroso, mas longe de ser decisivo. O homem se recobrou e voltou ao combate. 

O monstro atacou de novo. O homem esperou até o último segundo e, quando a distância entre os dois se tornou pequena, ele reagiu. Dessa vez o exterminador recorreu ao lança-chamas. As labaredas engoliram o alvo por alguns segundos. 

Mas uma mão emergiu do fogo e acertou Terminator com um soco poderoso, interrompendo o ataque. A criatura estava apenas chamuscada, pois seu exoesqueleto era muito expeço e a protegera das chamas.

O inimigo saltou sobre o homem e rompeu as mangueiras que conectavam os cilindros de veneno e querosene. Depois, agarrou o homem pela perna, e jogou-o para o alto, como um brinquedo. Mas ele se recuperou em pleno ar e conseguiu pousar em segurança. 

Agora que os cilindros não passavam de peso inútil sobre suas costas, Terminator os removeu para ganhar liberdade de movimento e agarrou a arma-chinelo, que até então repousava presa em sua cintura.

O homem avançou com grande ímpeto. A sola do chinelo cortou o ar e estraçalhou os braços do monstro, que reagiu urrando terrivelmente. Mas antes que pudesse comemorar, o homem viu o monstro regenerar instantaneamente os membros golpeados.

Os dois combatentes começaram a trocar uma sequência incrível de golpes. Parecia que a agilidade e a força de ambos eram idênticas. Nenhum conseguia sobressair-se ao outro. O sistema de respiração traqueal do monstro fornecia oxigênio diretamente aos músculos. Por sua vez, a estamina sobre humana do especialista impedia a produção de ácido lácteo na respiração anaeróbica.

Dessa forma, a luta permaneceu em pé de igualdade por longos minutos. Mas, finalmente, o exterminador começou a assumir o controle da luta. Ele começou a ferir o corpo do monstro mais rápido do que este podia regenerá-lo. Por fim, o homem esmagou a cabeça da barata, decapitando-a, e o corpo grotesco caiu pesadamente no chão.

Terminator se aproximou, apenas para verificar. Mas esse foi um grande erro, pois o monstro, que parecia abatido, ainda vivia. Mesmo decapitado, ele ainda era capaz de se mover.  Com suas garras, ele conseguiu rasgar o pescoço do especialista, que cambaleou para trás.

O sangramento intenso indicava que a jugular havia sido atingida. Enquanto tentava estancar o sangramento com as mãos, o homem correu até onde havia deixado os cilindros. Agarrou o cilindro que continha querosene, abriu-o e despejou todo seu conteúdo sobre o monstro, que já se esforçava para levantar. E com o isqueiro que usava para acionar a chama-piloto do lança-chamas, ateou fogo na criatura. 

Agora as chamas eram mais intensas e nem o exoesqueleto do homem-barata pôde resistir. Ele se debateu inutilmente, enquanto as chamas consumiam o seu corpo. Terminator, quase em choque pela hemorragia, conseguiu estancar o sangue com um quite de primeiros-socorros que trazia consigo, enquanto assistia o monstro transformar-se em uma pilha de cinzas.

A missão estava finalmente terminada. Usando um telefone especial, diretamente conectado às comunicações internas das forças armadas americanas, Terminator emitiu um alerta. Em poucas horas um helicóptero das forças especiais chegou ao local e o levou de volta a Washington.

Alguns dias depois, Teminator foi chamado novamente à Casa Branca. O Presidente aguardava-o, juntamente com alguns militares de alta patente. O homem adentrou o gabinete sem se dirigir a ninguém.

-Senhor Terminator, que bom revê-lo. – Cumprimentou o Presidente. – Vai ficar feliz em saber que o pagamento pelos seus excelentes serviços já foi depositado em sua conta.

-Que bom. – Respondeu, tão somente.

Logo em seguida, Terminator aproximou-se do Presidente e acertou-lhe um soco no rosto. Um golpe leve para os seus padrões. Ainda assim, todos os presentes ficaram estarrecidos, totalmente sem reação.

-Isso é para você aprender a não fazer merda com o dinheiro dos nossos impostos.

E dizendo apenas isso, foi embora.

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¹ Procedimento de manipulação genética através do qual porções não codificantes (íntrons) do RNA são removidas, restando apenas as porções codificantes (exons).
² Instituto de Tecnologia de Massachusetts, universidade privada reconhecida pela produção de mão de obra altamente capacitada e tecnologia de ponta nas mais diversas áreas.